sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Atualização dos temas

1. Intuição e Premonição (13/08)
2. Cloud Atlas: reencarnação (20/08)
3. Sensações do espírito após a morte(27/08)
4. Obsessão (03/09)
5. Espíritos mais iluminados (10/09) 
6. O espiritismo enquanto ciência: caráter investigativo(17/09)
7. Anjos e Demônios (24/09)
8. Eutanásia (01/10)
9. Espiritismo no Brasil
10. Aceitação da morte – como ficam o desencarnado e os familiares?
11. A ideia de morte para o espiritismo
12. Necessidade da reencarnação
13. “Para o céu dos cachorrinhos” – os animais e a doutrina espírita
14. Quantos somos? A relação entre encarnados e desencarnados na Terra 

Onde? PB12
Quando? Terças-feiras, das 18h às 19h.

The Prayer

Não importa a religião, mas sim a capacidade de ter fé !

E a oração é o melhor instrumento para buscarmos serenidade para enfrentar o dia-a-dia.

Que o final de semana seja repleto de alegria junto aos seus e muita Paz !


Te peço em oração
Nos mostra onde ir
Me ensina a confiar
Em tempos só de dor
Nossa oração
Em tempos de aflição
Faz nos confiar
Podemos mudar
Ver o mundo bem melhor

Te peço uma luz
Em nossos corações
E quando a noite vem
Vem nos assustar
Nossa oração
Na escuridão
Faz-nos confiar
Podemos mudar
Ver o mundo bem melhor

Sonho som um mundo
Sem a violência
Um mundo de justiça e esperança
Onde se estenda a mão
Ao seu vizinho
Símbolo de paz e de fraternidade

A força que me dá
E faz cessar a dor
A Sua paz e amor
Invada cada lar
Nossa oração
Como um pequeno Teu

Faz-nos confiar
Podemos mudar
Em um mundo bem melhor
Faz-nos confiar
Podemos mudar
Em um mundo bem melho
r






segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Porquê andar de ônibus faz bem ao seu caráter

Não confie completamente em uma pessoa que nunca andou de ônibus. Não importa se hoje você tem um Camaro Amarelo, se você já andou de ônibus em uma fase de sua vida, você não é a mesma pessoa. Digo mais: ainda que você tenha condições de comprar um Porsche para o seu filho quando ele fizer 18 anos, permita que ele passe ainda que poucos meses andando de ‘busão’. É que, para mim, este meio de transporte forma nosso caráter como chinelada nenhuma consegue fazer. Explico nos pontos seguintes. 

1) Paciência
Tudo começa no processo de espera. Você se vê encostado na parada de ônibus esperando pela boa vontade do mesmo. Você até já decorou o horário que o “seu” ônibus passa. Mas se o motorista resolver pisar forte no acelerador e passar 3 minutos antes, só resta a você esperar mais 45 minutos pelo próximo.
 
2) Lidar com a humilhação
Vem ao longe o ônibus. Você reconhece no letreiro luminoso que é o SEU ônibus. Seu coração acelera. Você corre atrás dele como o Super Mario corre atrás da Princesa. Ele se aproxima e você percebe que o condutor não diminuiu a velocidade. Por algum motivo, o motorista passou direto com direito a um sorriso maroto, apontando para um suposto ônibus que vem atrás. Você fica com cara de tacho e a mão apontando para o nada.
 
3) Respeito às diferenças
Quando o “ônibus de trás” finalmente chega após 23 minutos, é claro que ele estará parcial ou totalmente lotado. Você se depara com um misto de sons e batuques, pessoas do Manassés pedindo doação, menino vendendo balinha e o cobrador com o humor pior do que o de um siri na lata. Você toca, ainda que não queira, pessoas que você jamais tocaria na zona de conforto de seu carro. Você é obrigado a lidar com gente diferente, sentar ao lado delas e até puxar assunto sobre “como o tempo hoje está quente”. Enfim: você deixa de lado seu ego e deixa de tanta frescura.
 
4) Altruísmo
Ainda que contra sua própria vontade, as Leis da Ética de Ônibus™ ‏dizem que você deve ceder seu lugar aos mais velhos e se oferecer para segurar os livros do estudante de ensino médio do cabelo esquisito que está em pé ao seu lado. Resumindo: você aprende NA MARRA a ser gente boa.
 
5) Capacidade cognitiva e filosófica
Janela de ônibus é praticamente a janela de sua alma. Não existe um lugar melhor para refletir sobre sua vida e colocar os pensamentos em ordem. Nem seu travesseiro; nem montes no Himalaia. Você acaba encontrando soluções para seus problemas, resolvendo cálculos complexos e tendo a ideia que faltou naquele brainstorm da reunião. Ou seja, de certa forma você se torna mais inteligente.
 
6) Educação
É no ônibus que você coloca em prática as palavras mágicas que sua mãe ensinou: “obrigado” (para o motorista, na hora de descer), “por favor” (a Deus, para que seu ônibus não demore tanto – todo dia peço isso a Ele) e principalmente o “COM LICENÇA” (por motivos óbvios). Ou seja: 1 ano de estágio probatório pegando ônibus e você se torna um gentleman ou uma lady.
 
7) Histórias para contar pros netos
Quem nunca passou por situações exóticas, engraçadas e inusitadas em ônibus? Quem nunca pegou o ônibus errado e foi parar em uma boca de fumo? (eu já!) Quem nunca ia descendo do ônibus e só na escadinha disse: “eita, esqueci de pagar! Perae moço!” (eu já) Quem nunca já sentou ao lado de uma senhora que foi com sua cara e resolveu te aconselhar com muita sabedoria? (eu já…)

(Nota: desconheço o autor desse texto. Quem souber, dá um alô e a gente coloca os devidos créditos ;) )

sábado, 24 de agosto de 2013

Uma prece: vibração musical


"Ainda assim, é preciso reconhecer que a música é um precioso recurso terapêutico do ponto de vista espiritual e psicológico, recomendável para a harmonização interior que proporciona a sintonia com o Alto.(...) Fazemos tais reflexões em lembrança do último capítulo do livro "Boa Nova", em que Humberto de Campos descreve os últimos dias de Maria, a mãe de Jesus, na Terra e relata sua desencarnação. Uma caravana de Espíritos abnegados recepciona a Santíssima em sua reentrada no plano espiritual e ela deseja rever os panoramas da Palestina onde sofreu e se alegrou com seu filho bem-amado. Depois, Maria externa a intenção de ir até Roma, onde sabe que os seguidores do Cristo são martirizados no circo.
A comitiva então se desloca à pátria dos césares e Maria penetra uma das celas onde os fiéis esperam, aglomerados e tristes, o momento de adentrar a arena. A mãe do Senhor aproxima-se de uma jovem, toca em sua fronte e diz, na acústica do pensamento da moça: "Canta, minha filha!" A menina, subitamente inspirada, inicia timidamente um hino. Em seguida, os demais se contagiam e engrossam o coro. Quando a porta da prisão se abre, chegado o momento do sacrifício, todos marcham cantando louvores a Deus, preparados para entregar o corpo às feras... 
Léon Denis, em seu livro “O grande enigma”, vem falar da música das esferas, informando que todo movimento no universo, como o dos astros em sua caminhada cósmica, orbitando uns aos outros, é vibração musical. Talvez por isso o filósofo Huberto Rohden dissesse que a Musica, tanto quanto a Matemática e a Mística, é uma das linguagens de Deus.
Como se depreende, a música vem a ser um poderoso contributo para a harmonização tanto dos ambientes quanto das criaturas em demanda do equilíbrio psicofísico e espiritual, predispondo à oração e à meditação. O Espírito André Luiz, no livro “Nosso Lar” dá-nos um precioso exemplo nesse sentido. Retornando ao hospital, depois de sua primeira viagem de aeróbus, o “repórter do Além” ouve, com seu enfermeiro, em plena via pública, belas melodias atravessando o ar, ouvindo de Lísias a seguinte explicação: 
“- Essas músicas procedem das oficinas onde trabalham os habitantes de “Nosso Lar”. Após consecutivas observações, reconheceu a Governadoria que a música intensifica o rendimento do serviço, em todos os setores de esforço construtivo. Desde então, ninguém trabalha em “Nosso Lar” sem esse estímulo de alegria.” " (Francisco Muniz. Disponível em: http://almaespirita.blogspot.com.br/2013/02/musica-e-elevacao-espiritual.html


Música: Uma prece.(Cacau)



quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Temas de Estudos - II Semestre

Onde? PB 12
Quando? Terças-feiras, às 18h.
  1.   Intuição e Premonição  (13/08)
  2. Cloud Atlas: reencarnação (20/08)
  3. Sensações do espírito após a morte (27/08)
  4. Obsessão
  5.  Espíritos mais iluminados
  6. O espiritismo enquanto ciência: caráter investigativo
  7. Espiritismo no Brasil
  8. Aceitação da morte – como ficam o desencarnado e os familiares?
  9. A ideia de morte para o espiritismo
  10. Necessidade da reencarnação


    (imagem de vladstudio.deviantart)


terça-feira, 20 de agosto de 2013

O auxílio virá

O problema que te preocupa talvez te pareça excessivamente amargo ao coração.
E tão amargo que talvez não possas comentá-lo, de pronto.
Às vezes, a sombra interior é tamanha que tens a ideia de haver perdido o próprio rumo.
Entretanto, não esmoreças.
Abraça o dever que a vida te assinala.
Serve e ora.
A prece te renovará energias.
O trabalho te auxiliará.
Deus não nos abandonará.
Fazê silêncio e não te queixes.
Alegra-te e espera porque o Céu te socorrerá.
Por meios que desconheces, Deus permanece agindo.

Emmanuel

sábado, 20 de outubro de 2012

Solidão


“O presidente, porém, disse: — mas, que mal fez ele? E eles mais clamavam, dizendo: — seja crucificado.”
(Mateus, 27:23)

À medida que te elevas, monte acima, no desempenho do  próprio dever, experimentas a solidão dos cimos e incomensurável tristeza te constringe a alma sensível.
Onde se encontram os que sorriram contigo no parque primaveril da primeira mocidade? Onde pousam os corações que te buscavam o  aconchego nas horas de fantasia? Onde se acolhem quantos te partilhavam o pão e o sonho, nas aventuras ridentes do início?
Certo, ficaram...
Ficaram no vale, voejando em círculo estreito, à maneira das borboletas douradas, que se esfacelam ao primeiro contacto da menor chama de luz que se lhes descortine à frente.
Em torno de ti, a claridade, mas também o silêncio...
Dentro de ti, a felicidade de saber, mas igualmente a dor de não seres compreendido...
Tua voz grita sem eco e o teu anseio se alonga em vão.
Entretanto, se realmente sobes, que ouvidos te poderiam escutar a grande distância e que coração faminto de calor do vale se abalançaria a entender, de pronto, os teus ideais de altura?
Choras, indagas e sofres...
Contudo, que espécie de renascimento não será doloroso?
A ave, para libertar­-se, destrói o berço da casca em que se formou, e a semente, para produzir, sofre a dilaceração na cova desconhecida.
A solidão com o serviço aos semelhantes gera a grandeza.
A rocha que sustenta a planície costuma viver isolada e o Sol que alimenta o mundo inteiro brilha sozinho.
Não te canses de aprender a ciência da elevação.
Lembra­te do Senhor, que escalou o Calvário, de cruz aos ombros feridos.
Ninguém o seguiu na morte afrontosa, à exceção de dois malfeitores, constrangidos à punição, em obediência à justiça.
Recorda­te dele e segue...
Não relaciones os bens que já espalhaste.
Confia no Infinito Bem que te aguarda.
Não esperes pelos outros, na marcha de sacrifício e engrandecimento. E não olvides que, pelo ministério da redenção que exerceu  para todas as criaturas, o Divino Amigo dos Homens não somente viveu, lutou e sofreu sozinho, mas também foi perseguido e crucificado.


Emmanuel, Fonte Viva
Psicografado por F.C.Xavier

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Insegurança e crises



       Esboroam-se, sob os camartelos das revoluções hodiernas, os edifícios da tradição   ultramontana,   cedendo   lugar   às   apressadas   construções   do desequilíbrio, sem memória ancestral, sem alicerce cultural. 
       Ruem, diante dos abalos da ciência tecnológica, o empirismo passadista e as  obras  da  arbitrária  dominação  totalitária,  substituídos  pelo  alucinar  das novas maquinações de aventureiros desalmados, perseguindo suas ambições imediatistas a prejuízo da sociedade, do indivíduo.
       A política desgovernada exibe os seus corifeus, que se fazem triunfadores de  um  dia,  logo  passando  ao  anonimato,  repletos  de  gozos  e  valores perecíveis,  a  intoxicar-se  nos  vapores  dos  vícios  e  das  perversões  em  que falecem os últimos ideais que ainda possuíam. 
       Os  direitos  humanos  decantados  em  toda  parte  sofrem  o  vilipêndio daqueles que os deveriam defender, em razão do desrespeito que apresentam diante  das  leis  por  eles  mesmos  elaboradas,  em  desprezo  flagrante  às Instituições que se comprometeram socorrer, por descrédito de si próprios. 
       A anarquia substitui a ordem e as transformações sociais apressadas não têm  tempo  de  ser  assimiladas,  porque  substituídas  pelos  modismos  que  se multiplicam em velocidade ciclópica. 
        Velhos   dogmas,   nascidos   e   cultivados   no   caldo   da   ignorância,   são esquecidos e nascem as idéias liberais revolucionárias, que instigam o homem fraco contra o seu irmão mais forte gerando ódios, quando deveriam amansar o lobo ameaçador, a fim de que, pacificado, pudesse beber na mesma fonte com 
o cordeiro sedento, que lhe receberia proteção dignificadora. 
         As circunstâncias externas do inter-relacionamento das criaturas, fenômeno conseqüente ao desequilíbrio do indivíduo, engendram no contexto hodierno a insegurança, que fomenta as crises. 
         Sucedem-se,  desse  modo,  as  crises  de  autoridade,  de  respeito,  de honradez, de valores ético-morais, e a desumanização da criatura assoma nos painéis  do  comportamento,  insensibilizando-a  pelo  amolentamento  emocional ou  exacerbação,  na  volúpia  do  prazer  e  da  violência  conduzidos  pelas 
ambições desmedidas. 
          As crises respondem pela desconfiança das pessoas, umas em relação às outras,  pelo  rearmamento  belicoso  de  uns  indivíduos  contra  os  outros,  pela agressividade automática e atrevida. 
          A queda do respeito que todos se devem, respeito este sem castração nem temor,  estimula  a  indisciplina  que  começa  na  educação  das  gerações  novas, relegadas  a  plano  secundário,  em  que  se  cuidam  de  oferecer  coisas,  em mecanismos  sórdidos  de  chantagem  emocional,  evitando-se  dar  amor,  presença, companheirismo e orientação saudável. 
          A  crise  de  autoridade  responde  pela  corrupção  em  todas  as  áreas,  sob  a cobertura daqueles que deveriam zelar pelos bens públicos e administrá-los em favor  da  comunidade,  pois  que,  para  tal  se  candidataram  aos  postos  de comando, sendo remunerados pelos contribuintes para este fim. 
          Como efeito, os maus exemplos favorecem a desonestidade, discreta e pública, dos membros esfacelados do organismo social enfermo, preparando os bolsões  de  miséria  econômica,  moral,  com  todos  os  ingredientes  para  a rebelião criminosa, o assalto a mão armada, o apropriamento indébito dos bens alheios,  a  insegurança  geral.  O  que  se  nega  em  compromisso  de  direito,  é tomado em mancomunação da força com o ódio. 
           Mesmo  os  valores  espirituais  do  homem  se  apresentam  em  crise  de pastores,  e  amigos,  capazes  de  exercerem  o  ministério  da  fé  religiosa  com serenidade,  sem  separativismo,  com  amor,  sem  discórdia  na  grei,  com fraternidade, sem disputas da primazia, sem estrelismo. 
           Nas  várias  escolas  de  fé  espocam  a  rebelião,  as  disputas  lamentáveis,  a maledicência ácida ou o distanciamento formando quistos perigosos no corpo comunitário. 
           O  homem  apresenta-se  doente,  e  a  sociedade,  que  lhe  é  o  corpo  grupal, encontra-se desestruturada em padecimento total. 
           As crises gerais, que procedem da insegurança individual, são, por sua vez, responsáveis por mais altas e expressivas somas de desconforto, insatisfação, instabilidade emocional do homem, formando um círculo vicioso que se repete, sem aparente possibilidade de arrebentar as cadeias fortes que o constituem. 
           Vitimado por sucessivos choques desde o momento do parto, quando o ser é  expulso  do  claustro  materno,  onde  se  encontrava  em  segurança,  este enfrenta, desequipado, inumeráveis desafios que não logra superar. Chegando a  idade  adulta,  ei-lo  receoso,  desestruturado  para  enfrentar  a  maquinaria 
insensível  dos  dias  contemporâneos,  em  que  a  eletrônica  e  a  robótica  são conduzidas,  porém,  avançam,  tomando  o  controle  da  situação  e,  lentamente, reduzindo-o a observador das respostas e imposições digitadas, apertando ou desligando  controles  e  submetendo-se  aos  resultados preestabelecidos,  sem emoção, sem participação pessoal nos dados recolhidos. 
           Noutras  circunstâncias,  ou  em  estado  fetal,  experimenta  os  choques geradores de insegurança, no comportamento da gestante revoltada diante da maternidade não desejada e até mesmo odiada. 
           O jogo de reações nervosas, as vibrações deletérias da revolta contra o ser em     formação,     atingem-lhe     os     delicados     mecanismos     psíquicos, desarmonizando  os núcleos  geradores  do futuro equilíbrio,  sob  as  chuvas  de raios destruidores, que os afetam irreversivelmente. 
           O que o amor poderia realizar posteriormente e a educação lograr em forma de psicoterapia, ficam, à margem, sob os cuidados de pessoas remuneradas, sem   envolvimento   emocional   ou   interesse   pessoal,   produzindo   marcas profundas de abandono e solidão, que ressurgirão como traumas danosos no 
desenvolvimento da personalidade. 
           A par dos fatores sócio-mesológicos, outras razões são preponderantes na área  do  comportamento  inseguro,  que  são  aquelas  que  procedem  das reencarnações  anteriores,  malogradas  ou  assinaladas  pelos  golpes  violentos que foram aplicados pelo Espírito em desconcerto moral, ou que os padeceu nas rudes pugnas existenciais. 
           Assinalando   com   rigor   a   manifestação   da   afetividade   tranquila   ou desconfiada,  aquelas  impressões  são  arquivadas  no  inconsciente  profundo, graças aos mecanismos sutis do perispírito. O homem é um ser inacabado, que a atual existência deverá colaborar para o aperfeiçoamento a que se encontra destinado.  Faltando-lhe  os  recursos  favoráveis  ao  ajustamento,  torna-se  uma peça mal colocada ou inadaptada na complexidade da vida social, somando à sua   a   insegurança   dos   outros   membros,   assim   favorecendo   as   crises individuais e coletivas. 
          Por   desinformação   ou   fruto   de   um   contexto   imediatista   consumista, elaborou-se  a  tese  de  que  a  segurança pessoal  é  o  resultado  do ter,  que  se manifesta  pelo  poder  e  recebe  a  resposta  na  forma  de  parecer.  Todos  os mecanismos  responsáveis  pelo  homem  e  sua  sobrevivência  se  estribam 
nessas  propostas  falsas,  formando  uma  sociedade  de  forma,  sem  profundidade, de apresentação, sem estrutura psicológica nem equilíbrio moral. 
         Trabalhando  somente  no  exterior,  relega-se,  a  plano  secundário  ou  a nenhum, o sentido ético do ser humano, da sua realidade intrínseca, das suas possibilidades futuras, jacentes nele mesmo. 
          O  homem  deve  ser  educado  para  conviver  consigo  próprio,  com  a  sua solidão, com os seus momentâneos limites e ansiedades, administrando-os em proveito  pessoal,  de  modo  a  poder  compartir  emoções  e  reparti-las,  distribuir conquistas, ceder espaços, quando convidado à participação em outras vidas, ou pessoas outras vierem envolver-se na sua área emocional. 
          Desacostumado à convivência psíquica consciente com os seus problemas, mascara-se  com  as  fantasias  da  aparência  e  da  posse,  fracassando  nos momentos em que se deve enfrentar, refletido em outrem que o observa com os  mesmos  conflitos  e  inseguranças.  As  uniões  fraternais  então  se  desar-
ticulam, as afetivas se convertem em guerras surdas, o matrimônio naufraga, o relacionamento  social  sucumbe  disfarçado  nos  encontros  da  balbúrdia,  da extravagância, dos exageros alcoólicos, tóxicos, orgíacos, em mecanismos de fuga da realidade de cada um. 
          A educação, a psicoterapia, a metodologia da convivência humana devem estruturar-se  em  uma  consciência  de  ser,  antes  de  ter;  de  ser,  ao  invés  de poder, de ser, embora sem a preocupação de parecer 
          Os valores externos são incapazes de resolver as crises internas, aliás, não poucas vezes, desencadeando-as. 
           O   que   o   homem   é,   suas   realizações   íntimas,   sua   capacidade   de compreender-se, às pessoas e ao mundo, sua riqueza emocional e idealística, estruturam-no  para  os  embates,  que  fazem  parte  do  seu  modus  vivendi  e operandi, neste processo incessante de crescimento e cristificação. 
           A  coragem  para  os  enfrentamentos,  sem  violência  ou  recuos,  capacita-o para  os  logros  transformadores  do  ambiente  social,  que  deslocará  para  o passado  a  ocorrência  das  crises  de  comportamento,  iniciando-se  a  era  de construção ideal e de reconstrução ética, jamais vivida antes na sua legitimidade. 
           Os   conceitos   do   poder   e   da   força   estão   presentes   na   sistemática governança dos povos. 
           Sempre  os  militares  governaram  mais  do  que  os  filosóficos,  e  o  poder sempre  esteve  por  mais  tempo nas mãos dos  violentos  do  que na  sabedoria dos  pacíficos,  gerando  as  guerras  exteriores,  porque  os  seus  apaniguados viviam  em  constantes  guerras  íntimas,  inseguros,  aguardando  a  traição  dos fracos  que,  bajuladores,  os  rodeavam,  e  a audácia  dos mais fortes,  que  lhes ambicionavam o poderio, terminando, quase todos, vítimas das suas nefastas urdiduras. 
          A   segurança   íntima   conseguida   mediante   o   autodescobrimento,   a humanização  e  a  finalidade  nobre  que  se  deve  imprimir  à  vida  são  fatores decisivos  para  a  eliminação  das  crises,  porqüanto,  afinal,  a  descrença  que campeia e o desconcerto que se generaliza são defluentes do homem moderno que  se  encontra  em  crise  momentânea,  vitimado  pela  insegurança  que  o aturde. 




O Homem Integral - Joanna de Angelis
Psicografado por D. P. Franco

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Movimento Universitário Espírita

Pessoal, gostaria de divulgar minha dissertação de mestrado sobre o Movimento Universitário Espírita. Já está disponível na Biblioteca Digital da Unicamp. Acessem: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=000849101&opt=4
O trabalho está recheado de questões polêmicas que considero importantes. Será um prazer debatê-las!

domingo, 6 de maio de 2012

FÉ INOPERANTE



“Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma.” - (TIAGO,2:17.)

A fé inoperante é problema credor da melhor atenção, em todos os tempos, a fim de que os discípulos do Evangelho compreendam, com clareza,  que  o  ideal  mais  nobre,  sem  trabalho  que  o  materialize,  a 
benefício de todos, será sempre uma soberba paisagem improdutiva. 
Que  diremos  de  um  motor  precioso  do  qual  ninguém  se  utiliza?  de uma fonte que não se movimente para fertilizar o campo? de uma luz que não se irradie? 
Confiaremos  com  segurança  em  determinada  semente,  todavia,  se não  a  plantamos,  em  que  redundará  nossa  expectativa,  senão  em simples inutilidade? Sustentaremos absoluta esperança nas obras que a tora de madeira nos fornecerá, mas se não nos dispomos a usar o serrote e a plaina, certo a matéria-prima repousará, indefinidamente, a caminho da desintegração. 
A crença religiosa é o meio. 
O apostolado é o fim. 
A celeste confiança ilumina a inteligência para que a ação benéfica se estenda,  improvisando,  por  toda  parte,  bênçãos  de  paz  e  alegria, engrandecimento e sublimação. 
Quem puder receber uma gota de revelação espiritual, no imo do ser, demonstrando  o  amadurecimento  preciso  para  a  vida  superior, procure, de imediato, o posto de serviço que lhe compete, em favor do progresso comum. 
A fé, na essência, é aquele embrião de mostarda do ensinamento de 
Jesus que, em pleno crescimento, através da elevação pelo trabalho incessante, se converte no Reino Divino, onde a alma do crente passa a viver. 
Guardar, pois, o êxtase religioso no coração! sem qualquer atividade nas   obras   de   desenvolvimento   da   sabedoria   e   do   amor, consubstanciados  no  serviço  da  caridade  e  da  educação,  será conservar  na  terra  viva  do  sentimento  um  ídolo  morto,  sepultado entre as flores inúteis das promessas brilhantes. 

Emmanuel
Fonte Viva
Psicografado por Francisco C. Xavier

terça-feira, 24 de abril de 2012

Opinião: Sexo, Sexualidade(s) e Espiritismo

Artigo original em: http://maeliberdade.blogspot.com.br/2011/11/opiniao-sexo-sexualidades-e-espiritismo.html

Danilo Arnaut


Participo de um grupo discussão universitário de orientação espiritista, do qual fazem parte estudantes de diversas áreas acadêmicas, de diferentes origens e credos também. Em um dos nossos encontros, ofereci-me para fomentar o debate, trazendo elementos para uma discussão sobre o tema “Sexualidade”, proposto pelo grupo no início do ano letivo. Estando longe de ser um especialista no assunto e dispondo de pouco tempo para um pesquisa mais apurada ou para o amadurecimento de uma reflexão a respeito, fiz algumas anotações bastante preliminares e as dividi em três etapas: uma visão geral dos debates científicos sobre sexualidade (I), notas sobre o tema na doutrina e no movimento espiritistas (II) e, por fim, questionamentos e perspectivas no âmbito da sociedade contemporânea (III). 

I. Ciências do Sexo? Sexualidades nas ciências

O tema da sexualidade humana, isto é, das vivências sexuais de homens e mulheres foi, por muito tempo, ao menos nas sociedades ocidentais, um tema tradicionalmente marcado, impregnado, quando não dominado pelo discurso, prática e pensamento religiosos. Com o declínio do poder de influência das religiões no ocidente, a medicina e as ciências do comportamento, com destaque para a psicologia, tornam-se a base para a construção de novas normatividades (BOZON, 2004). Assim, o século XX foi marcado pela chamada revolução contraceptiva, fruto dos avanços da bioquímica, do mesmo modo que pela crescente discussão sobre o uso de preservativos, sobretudo masculinos, mas também femininos. O advento das técnicas de contracepção abre perspectivas no sentido da emancipação sexual da mulher que, a partir de então, poderia, ao menos em princípio, fazer sexo sem que houvesse o perigo de uma gravidez não desejada. Mais ainda, com o surgimento e a popularização dos preservativos, abre-se um imenso leque de possibilidades para as experiências sexuais, dessa vez sem o risco (evidentemente muito maior) da aquisição das doenças sexualmente transmissíveis. Nesse sentido, o uso, o não uso e o mal uso dos meios de prevenção a doenças, bem como dessa nova “liberdade” conquistada por homens e mulheres, são temas de grande parte dos estudos sobre sexualidade(s), em especial daqueles que envolvem juventude.

Do ponto de vista das ciências humanas, há uma tradição muito pouco sólida de estudos sobre sexualidade. Há um crescente interesse, nas última décadas, pelos chamados estudos de gênero, por exemplo, assim como já há estudos de referência sobre as vivências sexuais ao longo da história (ver, entre outros, Foucault e sua célebre História da Sexualidade, publicada entre 1976 e 1984). Já é possível também identificar um número significativo de estudos, de maior ou menor impacto, num campo como o da antropologia (Loyola, 2000), investigando temas como a questão da sensibilidade, além do sexo propriamente dito, como objetos de estudo ou enquanto vias para a construção subjetiva de si.

No âmbito dos estudos de gênero, tema caro ao das vivências sexuais, além de questões como homoafetividade, universos queer entre outras, destaco como extremamente significativa a problemática das crianças e dos jovens intersex. Na minha opinião, esse tipo de situação evidencia quais as nossas referências sócio-culturais no que diz respeito ao sexo e à sexualidade. Nesse sentido, trata-se de um fenômeno heurístico, isto é, um fenômeno através do qual podemos captar, com alguma perspicácia, aquilo que se passa no mundo hoje. Um bom exemplo de uma reflexão feita nesse sentido é o estudo da antropóloga Paula Sandrine Machado, que contrastou as perspectivas de médicos e familiares envolvidos nesse processo de exame e interferência sobre a anatomia, que leva em consideração visibilidades e invisibilidades do sexo dessas crianças e jovens. Ela propõe que “o sexo é tão construído na cultura quanto o gênero e que as fronteiras entre o natural e o não-natural são facilmente borradas quando se trata de definí-las a partir do que é considerado dentro e fora das normas sociais” (MACHADO, 2009).

II. Doutrina, doutrinadores e doutrinados: debates espíritas e sexualidades

Allan Kardek, n'O Livro dos Espíritos, dedica pelo menos três perguntas ao tema do sexo nos espíritos. Retomemos esse trecho:
“[Pergunta] 200 – Os espíritos têm sexos?- Não como o entendeis, pois, os sexos dependem do organismo. Entre eles há amor e simpatia baseados na identidade de sentimentos. 201 – O Espírito que animou o corpo de um homem, em nova existência, pode animar o de uma mulher, e vice-versa?- Sim, são os mesmos Espíritos que animam os homens e as mulheres.202 – Quando se é Espírito, prefere-se encarnar no corpo de um homem ou de uma mulher?- Isso pouco importa ao Espírito; ele escolhe segundo as provas que deve suportar” (KARDEK, 2005, grifos do autor).

Uma das ideias centrais à doutrina espírita é, na minha leitura, a do papel da experiência para o progresso do espírito. Afirmar que o espírito não tem sexo (no sentido biopsicofisiológico que atribuímos ao termo) não significa descrevê-lo como alheio à experiência sexual. A sexualidade está, como vimos anteriormente, relacionada a diversas outras dimensões da vida humana, como a família, a comunidade, a psique. Pode-se dizer que é nesse sentido que Francisco Cândido Xavier perguntava ao público do Pinga-Fogo, ainda em 1971, se o sexo, nas suas mais variadas manifestações, seria condenado às trevas. Ele lembra, aliás, na ocasião, que nós não somos chamados apenas à reprodução no sentido material, mas também à fecundidade espiritual. Encontramos, nos meios espíritas contemporâneos, ideias como essa, creio, de alto calibre intelectual e moral, e que se mostram (se não completamente corretas, porque humanas) ao menos construtivas, enriquecedoras do debate. Receio, no entanto, que esse quadro não se repita em grande parte (se não na maioria) dos debates espíritas de maior alcance. Quarenta anos mais tarde, ao vasculhar textos e vídeos a respeito do tema no meio espírita, encontrei um debate vago, ultrapassado do ponto de vista científico (e mesmo religioso), acorrentado pelo preconceito, uma das formas da crueldade humana, e turvado pelas sombras do senso comum e da ignorância grosseira. O leitor pode entender o meu comentário como um exagero. Mesmo porque, não sendo um especialista nem em Espiritismo, nem em sexualidade, é possível que eu esteja cometendo equívocos. Gostaria, porém, de explicar os porquês desses adjetivos.

Primeiramente, é preciso circunscrever o debate, observando de onde partem essas ideias e qual o seu alcance. Embora a doutrina espiritista tenha sido elaborada na Europa continental, a partir do trabalho admirável de Allan Kardec (pseudônimo de Hippolyte Léon Denizard Rivail, 1804-1869), o grande movimento espírita organiza-se e efetiva-se contemporaneamente, até onde conheço, no Brasil. Aqui surgiram suas grandes lideranças do século XX, aqui vive e daqui provêm a maioria dos seus adeptos, simpatizantes, estudiosos, que orientam-se pela e dialogam com a doutrina de maneira (diga-se de passagem) não necessariamente religiosa. Não pretendo discutir esse tema, mas creio que seja importante observar que quando falamos em “movimento espírita” referimo-nos, frequentemente, ao movimento espírita brasileiro.

Segundo, situado em um contexto brasileiro, o movimento tem reproduzido, precariamente inclusive, ecos de um debate acadêmico antigo e local (sobre esse debate acadêmico brasileiro, ver LOYOLA, 2000). Fala-se ainda, em considerável parcela dos debates espíritas, em “homossexualismo”, como se esse fosse “a” questão polêmica em termos de sexualidade. A ciência, aliás, faz alguns anos, já nem mesmo faz uso do sufixo “-ismo”. Muitos espíritas discutem, além disso, as causas daquilo que grande parte deles ainda considera um desvio de comportamento. Não as encontrando na ciência, cria-se, especula-se a respeito, na tentativa de manter um discurso moralizante, quando não moralista, travestido de entendimento. Esse não é um fato qualquer: contraria os preceitos-chave da doutrina espiritista, que defende, de um lado, o crivo da razão e a ciência e, de outro, a caridade, que também se manifesta no cuidado ao falar sobre os outros, nossos irmãos (orientação dada, em verdade, por Jesus, e assimilada pelo espiritismo, enquanto doutrina cristã).

Para ilustrar esse aspecto, vale a pena citar trechos de depoimentos de lideranças espíritas sobre o tema, colhidos recentemente por pesquisadores no assunto (Cf. NETO et al., 2009, de onde foram retirados todos os depoimentos que seguem). Foram entrevistadas quatro lideranças espíritas. A primeira liderança (os nomes não são dados) afirma que “o comportamento sexual entre homem e mulher também está bem definido na própria natureza, a própria natureza está definindo. Quando a gente sai fora, exagera, são questões puramente pessoais, questão de moral”. Essa liderança segue associando qualquer “desvio” a essa definição natural, ou “doença da alma”, como ele entende, às más inclinações de que nos fala a codificação espírita. Essa liderança afirma também ser contra as famílias formadas por pessoas do mesmo sexo: seriam, para ele, motivos de sofrimento para as crianças. À bissexualidade, essa liderança associa “a falta de educação” durante a infância, e argumenta: “a criança não foi devidamente educada, porque ou se é heterossexual ou se é homossexual. As duas coisas não consigo entender. Eu acho que quando é as duas coisas é falta de educação, pra mim faltou educação”. Por fim, procura explicar o fenômenos daquilo que denomina “um desvio sexual estabelecido na natureza” ou homossexualidade: tratar-se-ia (cito agora os pesquisadores que reportavam-se ao depoimento da liderança) de uma “vivência conflituosa desta sexualidade na vida atual”, causada por “transtornos e dificuldades vividos por uma pessoa no campo da sexualidade, em uma vida pretérita”.

A segunda liderança, mais moderada, observa que, junto com uma corrente que considera a homossexualidade como um desvio, há outra que a compreende como uma orientação sexual. Essa liderança mostrou-se preocupada com a efemeridade das relações homossexuais e defendeu a prática da monogamia como fundamento da construção da família – não importando, então, os sexos dos seus membros. Cita o livro Sexo e Destino, de André Luiz, psicografado por Chico Xavier e Waldo Vieira, apontando que no “mundo vidouro os irmão encarnados, tanto em condições normais, [quanto em] condições julgadas anormais, segundo os valores da sociedade, serão tratados em pé de igualdade no mesmo nível de dignidade humana” e que a lei caminha atualmente nessa direção. Para essa liderança, por fim, “não é a orientação sexual que determina a condição evolutiva de ninguém. (…) É onde você está mostrando qual o grau de responsabilidade que você lida com a sua energia sexual, com a sua sexualidade, independente da orientação sexual do companheiro”.

A terceira liderança sustenta que se deve, acima de tudo, aprender “a respeitar o outro e não ser promíscuo. Essa é a grande orientação. Eu vejo no plano espiritual até um respeito muito grande àquele espírito”. Observa que “o espiritismo nos coloca o sexo como algo que está presente na natureza, faz parte da natureza humana. (…) Não vai se deixar de viver o sexo, mesmo que não haja o casamento formal, com o papel, mas que haja naqueles que passam a ter uma vida em comum uma responsabilidade diante dessa vivência sexual, que essa vivência sexual seja feita com respeito ao parceiro, que não haja uma promiscuidade, no processo de sua vida sexual”.

Por fim, a quarta liderança entrevistada argumenta também no sentido de que o comportamento sexual é mais importante que a orientação: “o grande problema (…) é a promiscuidade”, afirma. Defende a prerrogativa da não proibição, mas sim educação, orientação. “Um livro do Chico Xavier [ditado por Emmanuel], 'Vida e Sexo', que eu acho um livro fabuloso, mas difícil. (…) Ele fala assim: 'não proibição, mas educação. Não a abstinência imposta, mas o emprego digno, com o devido respeito aos outros e a si mesmo. Não a indisciplina, mas controle. Não ao impulso livre, mas responsabilidade, porque ante o amor, ante a luz do amor e da vida, porque aplicação do sexo é assunto pertinente à consciência de cada um” (cf. NETO et al., 2009).

A julgar pela diversidade das posições, fica claro que os pontos de vista são tendencialmente idiossincráticos e não necessariamente doutrinários. Dito de outro modo, são as pessoas que fazem parte dos movimentos espiritistas que, hoje, pensam assim; trata-se de uma manifestação de suas ideias, e não de consensos ou mesmo de orientações gerais propostas pela codificação.

Nos meios acadêmicos, há anos já são problematizadas outras questões que, pode-se dizer, estão mais afinadas com a sociabilidade contemporânea, no Brasil ou no mundo. Ou seja, discute-se também, mas não apenas a homoafetividade. Nesse sentido, temas como o das crianças e jovens intersex já têm sido discutidos, assim como as novas e futuras formas das vivências afetivas humanas (nas suas diversas manifestações). Do mesmo modo, também se reconhece e combate o problema da violência sexual, cometida, em muitos casos, em casa, na intimidade do lar, por “pais de família” “heterossexuais”, que estupram mulheres, filhas e filhos, que são, ao menos nesse momento, vítimas indefesas. Nota: lembremo-nos que a oposição vítima e verdugo representa, tanto na academia quanto na doutrina espírita, uma discussão de maior complexidade, o que não impede, no entanto, o reconhecimento de que o estupro é um ato de violência e de crueldade.

Em suma, o debate sobre sexualidade no espiritismo ainda está muito ligado ao tema do homossexualismo - como eram designados, até os anos 1980, parte daquilo que hoje configura os chamados estudos sobre homoafetividade. Embora esse seja um tema importante e extremamente atual, parece-me um tanto limitado abordar a questão da vivência sexual somente partindo desse viés. No fundo, segue-se o princípio de que devemos começar enfrentando os problemas, as mazelas e anomalias da sociedade para podermos nos dirigir à nossa fatal felicidade, para evoluirmos, caminhando na direção do bem. E, enquanto a homossexualidade for vislumbrada como desvio, ainda haverá aqueles que pensam que discutir a sexualidade a partir desse prisma é um ato de caridade.

III. Amor e Paixão, amores e paixões: tendências do debate?

O debate sobre as vivências sexuais está em franca expansão, seja nos meios acadêmicos, nos espíritas, seja na sociedade de um modo geral, em nível nacional, regional e mundial. Trata-se de um dos temas que afloram necessariamente numa situação de globalização, através da qual o contato com o outro, as alteridades do mundo, é intensificado, escancarando-se, factualmente, as diversidades do mundo. O debate espírita, numa visão otimista, tem dado sinais de acompanhar, ainda que um pouco tardiamente, aquilo que se tem discutido na ciência: através do estudo, do bom senso, ou mesmo da reflexão amadurecida.

Encontrei vídeos na internet (ver referências) nos quais as maiores lideranças espíritas do país tratam do assunto. Eles não fogem completamente do padrão apresentado na seção anterior desse texto, mesmo porque muitos consistem apenas em respostas a perguntas de espectadores (e não em uma exposição desenvolvida, por exemplo). O que me impressionou, no entanto, foi uma tendência à recuperação de ideias fundamentais como a do princípio do amor ao próximo, de Cristo Jesus, e sua articulação com a reflexão sobre o tema na ciência e na moral espíritas. Assim, encontrei uma entrevista com José Medrado, por exemplo, em que ele exorta os espectadores a refletir sobre o ser cristão. Ele lembra que ser cristão não é condenar, nem julgar, mas sim acolher e respeitar. Medrado também esclarece que as causas da homossexualidade são desconhecidas à ciência – como o são, acrescente-se, as causas de todas as manifestações sexuais, inclusive as heteroafetivas, que não configuram mais que polêmicos debates no meio científico [o adendo é nosso]. Medrado observa também que muito da polêmica se deve ao estranhamento, isto é, ao choque provocado por aquilo com que não se está habituado. Exemplifica, nesse sentido, que muitas pessoas se chocam ao ver um casal de velhos se beijando em público. Não é habitual, o que, note o leitor, não significa dizer que não seja natural, que seja bom ou ruim. Nessa mesma entrevista, Medrado transmite uma belíssima mensagem de um amigo desencarnado (não identificado), que sintetiza sua explanação: “Nas tramas e dramas da alma milenar, nada é conceituado ou definido com uma simples oração”.

Em outra gravação, Raul Teixeira defende a educação para a vida como orientação para os espiritistas. Ele afirma, nessa direção, que “não cabe ao centro espírita traçar diretrizes para a vivência sexual dos seus frequentadores”. Isso representa, na minha opinião, um passo à frente de boa parte dos movimentos brasileiros de fé. Frequentemente aceita-se a diferença, desde que ela não seja tão diferente assim.

Outros, no entanto, defendem que a homossexualidade e, talvez possamos estender, todas as “irregularidades” afetivas e sexuais (no fundo é isso que se diz) estão ligadas, em muitos casos, ao mal aproveitamento da sexualidade em vidas passadas. Outra versão dessa teoria é aquela que afirma serem homossexuais e bissexuais espíritos que guardam impressões de uma vida anterior e vieram, assim, nesta vida, portadores de outro sexo com o intuito de aprender. Sendo assim, a diversidade sexual consistiria em um aprendizado. Isso é coerente com a doutrina espírita que, como disse anteriormente, atribui enorme valor à experiência, já que, por meio dela, complexificamo-nos, evoluímos da direção de Deus, da totalidade divina. No entanto, embora aparentemente moralizante, esse tipo de afirmação talvez esconda uma presunção que, diga-se de passagem, parece-me muito corrente nos meios espíritas: a de que alguém possa saber, de antemão, o que o outro tem para aprender.

Concluindo, tenho uma visão otimista dessa discussão, seja nos debates espíritas, jurídicos, científicos, seja naquilo que se convencionou chamar de senso comum, onde, a respeito desse tema, incluo-me sinceramente. As afetividades, as formas de amar, são um tema complexo e dinâmico, estando em constante debate e inovação. Bom será, no entanto, se lograrmos distinguir entre o Amor (A maiúsculo) e os amores da nossa vivência terrena.


Referências

- Trabalhos escritos:
ALMEIDA, M. 2003. “Antropologia e Sexualidade. (Consensos e Conflitos Teóricos em Perspectiva Histórica)”, in FONSECA, L.; SOARES, C. VAZ, J. M. (Org.) A Sexologia, Perspectiva Multidisciplinar. Coimbra: Quarteto, vol. II, pp. 53-72.
BOZON, M. 2004. Sociologia da sexualidade. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas.
KARDEC, A. [1857] O Livro dos Espíritos (Contendo os princípios da doutrina espírita). Trad. de S. Gentile. Araras: Instituto de Difusão Espírita, 2005.
LOYOLA, M. 2000. “A Antropologia da Sexualidade no Brasil”. Physis: Rev. Saúde Coletiva. Rio de Janeiro, 10(1): 143-167.
MACHADO, P. 2005. “O Sexo dos anjos: um olhar sobre a anatomia e a produção do sexo (como se fosse) natural”. Cadernos Pagu (24), janeiro-junho, pp. 249-281.
MOTT, L. “Teoria Antropológica e Sexualidade Humana”. Salvador: UFBa, s/ data. Disponível online em http://www.antropologia.ufba.br/artigos/teoria.pdf (acesso em 29.09.2011)
NASCIMENTO, E. 2004. “Sociologia da sexualidade” [resenha do livro de Michel Bozon]. Ciência e Saúde coletiva. Rio de Janeiro, Oct./ Dec.
NETO, J. P. (et al.). 2009. “As representações da diversidade sexual no campo religioso”. Serviço Social & Realidade, v. 18, N. 1, pp. 241-276.
OLTRAMARI, L. 2005. “Sociologia da sexualidade” [resenha do livro de M. Bozon]. Revista Brasileira de Educação, n. 29, Rio de Janeiro, May/ Aug.

-Vídeos disponíveis na rede mundial (acessados, pela última vez em 29.09.2011). Os vídeos não trazem, contudo, a data da gravação.
Educação homossexual”, trecho de uma palestra de Raul Teixeira. http://www.youtube.com/watch?v=Lh74DWcKhiM.
José Medrado responde a perguntas sobre a Homossexualidade”, vídeo dividido em partes diversas. http://www.youtube.com/watch?v=F4qN3LHUN-g
Homossexualidade e Espiritismo”, trecho do programa “Espiritismo via Satélite”, veiculado em 2001. http://www.youtube.com/watch?v=BQRQKs5ihEQ
Divaldo Franco, Homossexualismo à Luz do Espiritismo” [a] http://www.youtube.com/watch?v=kDo-nvNkWb8&feature=related.
O que fiz em vidas passadas para nascer Gay?” http://www.youtube.com/watch?v=eZ2swdCX_n8&feature=related
Divaldo Franco. Homossexualismo à Luz do Espiritismo” [b] http://www.youtube.com/watch?v=PBtmwFUpqho&feature=related
Homossexualidade – Profissão Repórter”, 3 partes, http://www.youtube.com/watch?v=oWYnFlQQ6Dk&feature=related
Pinga-Fogo – Entrevista Chico Xavier”, 1971. http://www.youtube.com/watch?v=WW0ajzw1vbg

terça-feira, 20 de março de 2012

Amor a si mesmo

A síntese proposta por Jesus, em torno do amor, é das mais belas psicoterapias que se conhece: Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo.
Ante a impossibilidade de o homem amar a Deus em plenitude, já que tem dificuldade em conceber o absoluto, realiza o mister, invertendo a ordem do ensinamento,amando-se de início, a fim de desenvolver as aptidões que lhe dormem em latência.
Esforçando-se para adquirir valores iluminativos a cada momento, cresce na direção do amor ao próximo, decorrência natural do autoamor, já que o outro é extensão dele mesmo.
Então, finalmente conquista o amor a Deus, em uma transcendência incomparável, na qual o amor predomina em todas as emoções e é o responsável por todos os atos.
O Espírito Joanna de Ângelis, através da mediunidade de Divaldo Franco, apresenta a necessidade primeira de autoamor, como alavanca fundamental para a conquista de todas as esferas desse sentimento supremo.
Mas, de que forma amar a si mesmo?
O como a si mesmo, da proposta de Jesus, é um imperativo que não deve ser confundido com o egoísmo, ou o egocentrismo.
Amar a si mesmo significa respeito e direito à vida, à felicidade que o indivíduo tem e merece.
Trata-se de um amor preservador da paz, do culto aos hábitos sadios e dos cuidados morais, espirituais e intelectuais para consigo mesmo.
É sempre estar fazendo as melhores escolhas para si mesmo, vendo-se como Espírito imortal, sem nunca deixar de respeitar, obviamente, o bem comum.
Quando escolho amar mais minha família, dedicando-me inteiramente aos relacionamentos, cultivando a paciência e a tolerância, estou amando a mim mesmo.
Quando escolho perdoar e deixar de levar comigo o peso de uma mágoa, estou amando a mim mesmo.
Quando escolho aprender, buscando aprimoramento intelectual nas áreas do conhecimento de meu interesse, estou me autoamando.
Quando me aceito como sou e vejo em minhas imperfeições situações temporárias - uma vez que me esforço para corrigir meus erros - estou amando a mim mesmo.
Quando me dedico, diariamente, ao exame de consciência, à meditação, ao autoconhecimento, estou dando provas de amor a mim mesmo.
São exemplos de atitudes, de pensamentos e sentimentos que elevam nossa autoestima - que é este julgamento que fazemos de nós mesmos - e nos empurram sempre para frente, para a felicidade.
O autoamor proporciona uma visão mais clara de quem se é, do que se deseja e do que não se deseja para si.
É através dele que estabelecemos metas para nossa existência: metas educacionais, familiares, sociais, artísticas, econômicas e espirituais, pensando em nós não apenas agora, mas nos cuidados para com o futuro.
Somos todos importantes. Criaturas únicas no Universo que buscam a felicidade através do aprender a amar: a si, ao outro e a Deus.
Ame a você mesmo... Enquanto é hoje.

Redação do Momento Espírita, com base no cap. 13, do livro Amor, imbatível amor, de Joanna de Ângelis, psicografia de Divaldo Pereira Franco, ed. Leal.
Em 15.11.2011.

terça-feira, 6 de março de 2012

Avisos:

Pessoal! As reuniões do NEUU no primeiro semestre de 2012 serão realizadas todas as terça-feiras das 18h00min às 18h50min no PB02 (Prédio Básico; Ciclo Básico II).
 
Aproveitando, visitem nossa página no FACEBOOK Núcleo Espírita Universitário da Unicamp

sábado, 30 de abril de 2011

terça-feira, 26 de abril de 2011

Pétalas d'Aurora: Oração

Pétalas d'Aurora: Oração: "Vós que sois a mãe bondosa De todos os desvalidos Deste vale de gemidos. Mãe piedosa!... Sublime estrela que brilha No céu da paz, da..."

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Pétalas d'Aurora: AUTOLIBERTAÇÃO

Pétalas d'Aurora: AUTOLIBERTAÇÃO: " '...Nada trouxemos para este mundo e manifesto é que nada podemos levar dele' - Paulo (I Timóteo, 6:7.) Se desejas emancipar a alma das grilhetas escuras do "eu",... "

domingo, 17 de abril de 2011

Pétalas d'Aurora: Súplica

Pétalas d'Aurora: Súplica: "Ó Pai,
Hoje estou aqui com carinho daqueles que até doem.Daqueles que olham para o alto e rogam em silêncio, enquanto se de..."

quarta-feira, 13 de abril de 2011

sábado, 26 de março de 2011

Pensamento social espírita e economia solidária


Introdução

Em princípio, a muitos pode causar alguma estranheza abordar conjuntamente economia e Espiritismo[1]. Em parte, o objetivo desse artigo é desfazer esta impressão mais ou menos generalizada, mostrando as conexões entre os dois conhecimentos e avançando, assim, na proposição fundamental que pretendemos tornar patente: a de que o pensamento social espírita pode ir ao encontro da economia solidária.

Importa frisar que o objetivo deste breve ensaio, caracterizado como um esboço argumentativo, não é sustentar um argumento científico – deseja-se, isto sim, ensaiar filosoficamente a conexão conceitual entre pensamento social espírita e economia solidária.

Dentre outras possibilidades, o pensamento social espírita pode ser entendido como a aplicação das Leis Morais (expostas e refletidas na 3ª Parte d’O Livro dos Espíritos) ao conjunto da sociedade, encarando a vida dos indivíduos na sua permanente conexão com o todo social[2]. Partindo do pensamento social espírita pode-se erigir ainda uma ação social espírita.

De outra parte, a economia, na sua origem etimológica, é “o cuidado, a gestão da casa” e por conseqüência daqueles que nela habitam[3]. Nesse sentido, o seu fim último é o bem comum. Por isso economia deve ser a gestão da riqueza para o bem comum, abarcando tanto uma teoria quanto uma prática para realizar tal objetivo.

Como o Espiritismo proclama a máxima cristã de “amar ao próximo como a si mesmo”, parece-nos evidente, portanto, que o bem comum é (ou deveria ser) um ponto de contato fundamental com a economia. Aliás, numa acepção moral absoluta, o bem, em última análise, só pode ser comum[4], pois todo o bem promovido em favor de si tem por conseqüência um benefício dos que estão próximos, sendo um acréscimo ao progresso da humanidade, enquanto todo o bem promovido em favor do próximo é, pela mesma razão, um benefício para si. Assim, a expressão “bem comum” visa apenas o reforço a uma característica fundamental à idéia de “bem”.

Já a economia solidária pode ser definida de diversos modos. Optamos porém pela seguinte: é

um sistema socioeconômico aberto, fundado nos valores da cooperação, da partilha, da reciprocidade e da solidariedade, e organizado de forma autogestionária a partir das necessidades, desejos e aspirações da pessoa, comunidade, sociedade e espécie, com o fim de emancipar sua capacidade cognitiva e criativa e libertar seu tempo de trabalho das atividades restritas à sobrevivência material, de modo a tornar viável e sustentável seu desenvolvimento propriamente humano, social e de espécie. (ARRUDA, 2003, p. 237)

Os seus princípios são: cooperação, autogestão, viabilidade econômica e solidariedade. Destacamos a autogestão como elemento central de contraposição ao capitalismo[5] (uma condição necessária, porém não suficiente para a sua superação) e a solidariedade como um elo importante com o Espiritismo. Marcos Arruda (ARRUDA, 2003, p. 233) entende que existe na humanidade uma solidariedade ontológica (a de seres da mesma espécie) que, contudo, não é suficiente para estabelecer a solidariedade como lógica predominante na totalidade das relações sociais. Por isso é preciso promover uma solidariedade consciente, o que exige um trabalho de transformação cultural baseado no imperativo racional de que só a solidariedade nos satisfaz plenamente[6]. Em outras palavras, só a solidariedade nos leva à felicidade. Portanto, para alcançarmos as condições de felicidade geral, é necessário construir uma sociedade solidária

Agora, voltemo-nos para o outro princípio destacado na economia solidária, o da autogestão. Mencionamos que este princípio constitui a economia solidária como uma alternativa ao capitalismo. Por quê? Basicamente porque a autogestão solidária prima pela valorização do trabalho acima do capital[7], relação inversa àquela estabelecida pela economia capitalista. Num empreendimento econômico solidário a remuneração deve ser totalmente baseada no fator trabalho, já numa empresa capitalista quem investiu capital é quem terá a maior remuneração.

Mas se a economia solidária é, idealmente, uma alternativa ao capitalismo, devemos responder a uma questão central: por que optar pela economia solidária? A nossa resposta, que pretendemos articular nesse pequeno texto, é: porque o capitalismo é injusto.

A injustiça do capitalismo

Examinemos as razões – ao menos, as que nós consideramos principais - pelas quais o capitalismo deve ser considerado um sistema social injusto.

Em primeiro lugar oferecer capital não vale mais do que oferecer trabalho. Na empresa capitalista, os donos da empresa, por serem os proprietários dos meios de produção[8], têm o poder de se apropriar da riqueza produzida pelos trabalhadores. Essa riqueza tem um valor que é criado pelo trabalho.

Deste valor, que corresponde ao produto social, uma parte tem de ser paga aos trabalhadores, sob a forma de salários. O que resta constitui o lucro bruto, parte do qual os capitalistas redistribuirão como juros, aluguéis, renda da terra e tributos respectivamente a prestamistas, a proprietários de imóveis ou terras e ao Estado. (SINGER, 2008, p. 93)

O restante pode ser em parte reinvestido na empresa e em parte apropriado pelo capitalista para usufruto pessoal. Evidentemente, os capitalistas, por deterem os meios de produção, terão sempre mais riqueza que os assalariados. A relação de troca entre aqueles que oferecem o capital e aqueles que oferecem o trabalho é portanto extremamente desigual e por isso injusta. Afinal, por que deveríamos considerar a posse do capital como mais valorosa do que o exercício do trabalho?[9] Em suma, a repartição da renda no modo de produção capitalista, por se basear na partilha do produto social entre capital e trabalho, é eminentemente injusta, pois o primeiro é sempre mais remunerado que o segundo, sem qualquer justificativa moral para isso[10].

Neste momento, é importante lembrar o ensino dos Espíritos acerca da relação entre necessário/supérfluo. No capitalismo, os proprietários dos meios de produção (nas grandes empresas, os acionistas majoritários), ou os que detêm o poder de gerência dos meios de produção (a chamada “burguesia gerencial”, ricamente remunerada), têm a permanente possibilidade e inclusive o estímulo ao acúmulo pessoal, visando o gozo de supérfluos que lhes dá a visibilidade de um “status superior”, contribuindo para a manutenção das mesmas relações de poder que lhes conferem privilégios na hierarquia social. Pode-se argumentar que esse comportamento egoísta pode ser transformado pela livre-vontade dos próprios capitalistas, que passariam a utilizar a sua riqueza acumulada para finalidades altruísticas. Entretanto, levando em consideração que este comportamento egoísta prejudica enormemente a imensa maioria da população na Terra, devemos simplesmente aguardar pela transformação moral da elite econômica do planeta, ainda que apelando para a sua consciência? Penso que este raciocínio falha por ignorar o princípio democrático de regulação social. Quando alguém comete qualquer crime (reconhecido social e legalmente como tal) deve ser penalizado de acordo com a legislação vigente. Não nos limitamos a esperar que os criminosos transformem-se moralmente fazendo apenas apelos a sua consciência. Enquanto sociedade, procuramos, isto sim, coibir e punir o crime. Da mesma maneira entendemos a questão social. A apropriação desigual da riqueza com base no regime da propriedade privada dos meios de produção afeta toda a sociedade de modo desigual e injusto, portanto cabe a sociedade organizada dar uma resposta coletiva e democrática – inclusive juridicamente – a tal problema.

Com base nas questões 711 e 717 d’O Livro dos Espíritos, podemos dizer que aqueles que se apropriam dos bens da Terra para além do que deviam, acumulando supérfluos e impondo a escassez do necessário para multidões, “desconhecem a lei de Deus e terão de responder pelas privações que ocasionaram”. Se considerarmos que o capitalismo estimula a concentração do supérfluo para poucos e a escassez do necessário para muitos, então este sistema social deve ser condenado.

Em segundo lugar, a origem do capital não tem relação necessária com o mérito. Isto porque em grande medida o capitalista herda parte do seu capital. E, conforme os estudos históricos[11] e O Livro dos Espíritos, a origem do capital encontra-se freqüentemente na astúcia e no roubo (LE 808 e 808a). Portanto, embora seja possível a aquisição meritória de capital, esta modalidade não explica a totalidade e sequer a maioria do montante da distribuição de capital no planeta. Lembrando o quanto é importante a noção de mérito para a Doutrina Espírita, vale destacar que um sistema social que produz desigualdade para além das conseqüências da desigualdade de mérito, é essencialmente injusto. Para ilustrar o raciocínio, citemos por extenso as questões 806 e 806a d’O Livro dos Espíritos:

806. A desigualdade das condições sociais é uma lei natural?

- Não; é obra do homem e não de Deus.

806-a. Essa desigualdade desaparecerá um dia?

- Só as leis de Deus são eternas. Não a vês desaparecer pouco a pouco, todos os dias? Essa desigualdade desaparecerá juntamente com a predominância do orgulho e do egoísmo, restando tão-somente a desigualdade de mérito. Chegará um dia em que os membros da grande família dos filhos de Deus não mais se olharão como de sangue mais ou menos puro, pois somente o Espírito é mais puro ou menos puro, e isso não depende da posição social.

Excetuando os progressos no sentido de diminuir a essencialização da desigualdade social (noções como “pureza de sangue”, associadas à de “nobreza”, estão praticamente em desuso na maior parte do globo terrestre), cumpre destacar que estamos longe de uma sociedade em que reste “tão-somente a desigualdade de mérito”.

Outra razão pela qual o capitalismo deve ser considerado injusto é que esse sistema social se alimenta e fomenta a desigualdade. De certo modo já trouxemos esse argumento, porém importa destacar o ciclo vicioso da desigualdade inerente ao capitalismo. Nesse modo de produção é necessária a existência de uma desigualdade básica: a de classes – isto é, a existência dos proprietários dos meios de produção e os proletariados (por definição, os que não possuem meios de produção). Esta desigualdade fundamental inviabiliza qualquer tentativa de promoção da igualdade social, a exemplo da transferência de renda via tributação. Isto por uma razão: quem detém os meios de produção detêm o poder econômico e quem detém o poder econômico, cedo ou tarde, detêm o poder político. Esta equação é demonstrada pela história da humanidade. Além disso, se o capitalismo se alimenta da desigualdade social, ele também a fomenta com a tendência à acumulação e concentração do capital. Por um lado, os capitalistas não podem permitir a igualdade na repartição da renda, pois isso significaria a sua ruína enquanto detentores do monopólio dos meios de produção, já que os assalariados poderiam todos se tornar empreendedores a lhes fazer concorrência, abandonando o posto de assalariado e tornado-se também proprietários de meios de produção. Por outro, as empresas mais fortes tornam-se vitoriosas no mercado concorrencial, em detrimento das mais fracas. Sendo mais fortes, tendem a vencer e permanecer vencendo e derrubando cada vez mais empresas, à medida que se expandem. No limite, só restam gigantescos conglomerados empresariais, que se fundem rumo aos monopólios, deixando baixíssima possibilidade de empreendedorismo para os micros e pequenos empresários. Esta é a conhecida tendência monopolística do capitalismo.

Quanto à questão igualdade/desigualdade, lembremos mais uma vez O Livro dos Espíritos. Se já vimos que a desigualdade das condições sociais deve desaparecer, é oportuno verificar, em particular, a posição dos Espíritos, na obra supracitada, quanto à desigualdade das riquezas. Apesar da igualdade absoluta das riquezas não ser possível, em função da diversidade das faculdades e dos caracteres dos indivíduos (LE 811), o bem-estar

é relativo e cada um poderia gozá-lo, se todos se entendessem bem... Porque o verdadeiro bem-estar consiste no emprego do tempo de acordo com a vontade, e não em trabalhos pelos quais não se tem nenhum gosto. Como cada um tem aptidões diferentes, nenhum trabalho útil ficaria por fazer. O equilíbrio existe em tudo e é o homem quem o perturba. (LE 812; grifo nosso)

Destaquemos dois aspectos da questão. Primeiro: não existe bem-estar na vida dos encarnados sem um mínimo de condições materiais[12]. Portanto, a busca por equiparações na renda, na justa distribuição da riqueza, continua sendo fundamental para gerir os recursos, os bens da Terra, no sentido de atender às necessidades de todos, mesmo que uma igualdade absoluta seja inviável e mesmo oposta à justiça baseada no mérito. Segundo: o bem-estar está diretamente ligado ao trabalho. Este aspecto remete ao nosso último argumento para a condenação moral ao capitalismo.

Então, por fim, mas não menos importante, afirmamos que o capitalismo não permite a evolução integral dos Espíritos. No capitalismo, para a manutenção do poder dos proprietários dos meios de produção, é importante manter a divisão entre gestão e execução do trabalho, ou entre trabalho intelectual e trabalho manual, ou entre trabalho criativo e trabalho repetitivo, mecânico. Os trabalhadores assalariados não devem dominar a totalidade do processo produtivo, pois isso, acrescido de algum capital (o que pode ser obtido com a soma de diversos pequenos capitais ou mesmo através do Estado), lhes daria o poder de produzirem autonomamente a sua riqueza, o seu sustento, sem a necessidade do “patrão”. Como vimos, é fundamental para o capitalista manter a mão-de-obra assalariada. E, além disso, é fundamental ainda manter uma mão-de-obra assalariada desempregada, o chamado “exército industrial de reserva”, para o controle dos salários pelos capitalistas, já que se todos estivessem empregados, os trabalhadores assalariados poderiam barganhar livremente o seu salário, buscando a sua elevação, sem o risco de demissão, pois não haveria trabalhadores desempregados para os substituírem (sendo crucial a sua manutenção no quadro das empresas para a manutenção do mesmo nível de produção). De tudo isso concluímos dois problemas para examinarmos à luz da Doutrina Espírita: no capitalismo o desemprego é estrutural (nunca acabará) e o trabalho é intelectualmente limitado e limitante no que concerne a imensa maioria da população mundial.

Em razão desses problemas, cabe tratarmos da questão buscando n’O Livro dos Espíritos a Lei do Trabalho. Sabemos que o trabalho é conceituado como sendo toda ocupação útil (LE 675) e que é imposto ao ser humano encarnado em conseqüência da sua natureza corpórea, funcionando como uma expiação e um meio de aperfeiçoar a sua inteligência (LE 676). A idéia de trabalho como ocupação útil é de caráter social, pois se trata de sermos úteis aos nossos semelhantes (LE 679). Portanto, não basta uma utilidade egoísta, é necessário beneficiar o próximo, e o próximo inclui toda a humanidade (ou mesmo toda a criação de Deus). Lembrando, é claro, que o trabalho que se caracteriza como um aperfeiçoamento de si (LE 679), por extensão é também um bem para o próximo. Em suma, o trabalho é um fator de desenvolvimento importantíssimo para o Espírito; sem trabalho não há evolução. Sendo assim, um sistema social que necessita do desemprego para se estruturar não pode atender plenamente a uma demanda fundamental do ser humano para a sua evolução.

Não obstante, resta notar que “a natureza do trabalho é relativa à natureza das necessidades” (LE 678). N’O Livro dos Espíritos esta questão (678) parece indicar apenas que quanto menor forem as nossas necessidades materiais, menos material será o trabalho. A idéia de “necessidades”, nesse contexto, parece mesmo estar restrita às necessidades de consumo, de uso de produtos e serviços. Porém, gostaríamos de tentar extrapolar esta noção para provocarmos uma reflexão sobre um dos problemas colocado mais acima, a saber, o da característica limitada e limitante do trabalho assalariado da imensa maioria da população. Já vimos que o trabalho serve ao aprimoramento da inteligência e agora, ainda, pretendemos fazer notar que diante de uma necessidade, de uma demanda, por um maior desenvolvimento intelectual, a organização social deve atribuir às pessoas a consecução de um trabalho menos material, isto é, um trabalho mais intelectual. Portanto, interpretando a noção de necessidade na questão 678 como significando não apenas uma “necessidade de consumo”, mas também uma “necessidade de exercício”, de um fazer intelectual, podemos avançar a tese de que o tipo de trabalho ofertado no capitalismo está aquém das necessidades evolutivas dos seres humanos.

Os seres humanos precisam, para a sua evolução integral, de um trabalho que lhes tragam bem-estar (LE 812) e que lhes favoreçam o aprimoramento da inteligência e da moral, na base dos valores da solidariedade, da cooperação e da autogestão. A possibilidade de exercer plenamente estes valores no campo do trabalho encontra-se na economia solidária.

Em defesa da economia solidária

Terminada enfim a argumentação contra a opção capitalista, chegamos à defesa da alternativa da economia solidária. A economia solidária estabelece a centralidade do trabalho frente ao capital. Todos que trabalham recebem integralmente a sua parte da riqueza produzida. O trabalho é a base da remuneração e não o capital. Quem mais trabalha, mais recebe, e quem decide não trabalhar não pode continuar num empreendimento econômico solidário. A solidariedade, entretanto, torna o trabalho um empreendimento “familiar”, no qual todos se ajudam, compreendendo as possibilidades e necessidades particulares; o caráter do trabalho, animado pela solidariedade, ganha em democracia e libera-se das relações hierárquicas.

A economia solidária também promove a propriedade coletiva dos meios de produção, baseando-se em modelos associativistas e cooperativistas. Se verificarmos o que é dito sobre a propriedade n’O Livro dos Espíritos, mais uma vez encontraremos interessantes subsídios para a nossa reflexão. Da questão 880 a 885, Kardec insiste no ponto de vista liberal que defende firmemente o direito à propriedade privada. As respostas dos espíritos, entretanto, relativizam o direito à propriedade, subordinando-o aos critérios de justiça e solidariedade. A propriedade só é legítima quando “foi adquirida sem prejuízo para os outros” (LE 884) e o que for acumulado como fruto de um trabalho honesto deve servir ao próximo, já que a intenção deve ser a de “auxiliar o seu semelhante” (LE 883a). Na questão 881 fala-se ainda em ajuntar o que necessitamos para viver e repousar através de um trabalho honesto, “em família, como a abelha” e não “como um egoísta”. Ora, a propriedade privada dos meios de produção, por alijar o próximo (que não a possui) do direito a usufruir da riqueza que produz como fruto do seu próprio trabalho, não preenche os requisitos morais que a Doutrina Espírita prescreve para a legitimação da propriedade. Isto é, já que a propriedade privada dos meios de produção traz em última instância um “prejuízo para os outros” (os que não detêm essa propriedade), ela, a nosso ver, enquadra-se na categoria de propriedade ilegítima. Por mais consagrada que seja na nossa sociedade esta categoria de propriedade, devemos ter muito cuidado para não absolutizá-la como inevitável e como a mais justa das formas legais. Nesse sentido citamos a questão 885 para nossa meditação:

885. O direito de propriedade é sem limites?

- Sem dúvida, tudo o que é legitimamente adquirido é uma propriedade, mas, como já dissemos, a legislação humana é imperfeita e consagra freqüentemente direitos convencionais que a justiça natural reprova. É por isso que os homens reformam suas leis à medida que o progresso se realiza e que eles compreendem melhor a justiça. O que num século parece perfeito, no século seguinte se apresenta como bárbaro.

Com a autogestão, temos a possibilidade de um desenvolvimento integral do Espírito, pois a todos cabe a atividade eminentemente intelectual de gerência e direção além da atividade eminentemente material do trabalho manual. Para isso estabelece-se o rodízio das funções (uma diretoria pode manter-se por um ou dois anos, devendo ser substituída por novos membros, perfazendo idealmente a totalidade dos associados ou cooperados) e a polivalência de todos, dando o conhecimento de todo o processo produtivo, necessário para uma ideal coordenação de esforços. O processo decisório na condução do empreendimento econômico solidário se completa com a assembléia dos trabalhadores (na qual cada “cabeça” vale um voto) e outras instâncias que se mostrem eficazes na gestão democrática. Com tudo isso oferta ainda a possibilidade crescente de adoção de trabalhos que atendam às necessidades específicas de gosto e aptidão (inclusive com o horizonte aberto de desenvolvimento de novos gostos e aptidões), o que deve levar ao almejado bem-estar (LE 812). Recordemos que o trabalho estrito, para a produção de valor, cobre quase um terço da vida adulta dos seres humanos, já que a maioria das pessoas trabalha cerca de oito horas diárias, subtraindo folgas semanais e férias remuneradas. Se excetuarmos ainda o tempo reservado ao sono, necessário ao descanso do corpo físico, que idealmente fica em torno de oito horas diárias, o trabalho para a produção de valor responde pela metade da ocupação do nosso tempo de encarnação. É muito! Em razão disso acreditamos que esta esfera da vida social deva receber maior atenção de todos, pois muito contribui para a qualidade da nossa existência.

A autogestão no trabalho deve concorrer também para a promoção de uma cultura política autogestionária. Isto é, uma sociedade que inclua a todos, enquanto cidadãos, na atividade de gerir a si mesmos, em todas as esferas da vida. Trata-se de assumirmos uma responsabilidade solidária perante nós mesmos e perante toda a humanidade, construindo coletivamente direitos e deveres, tomando decisões que afetam a si e ao outro. Uma cultura autogestionária e solidária corresponde, a nosso ver, à aplicação social da máxima cristã: “ama ao próximo como a ti mesmo” ou “faça aos outros aquilo que quer para si”. Nessa perspectiva, o modelo atual de Estado deve ser substituído paulatinamente por uma estruturação política radicalmente democrática, pautada pela livre associação, com ênfase na tomada de decisão direta e na representação organicamente ligada aos interesses coletivos, definidos do particular ao geral, com o envolvimento de todos. É claro que isto tudo exige um imenso trabalho cultural de educação para a autogestão solidária, ao qual ninguém pode se furtar se desejar contribuir para a realização de uma sociedade mais justa e amorosa.

No momento, já é possível notar que a economia solidária preenche, idealmente, o requisito moral de não cometer injustiças (o que a economia capitalista não consegue). Além disso, num sentido positivo, a economia solidária promove a justiça e o amor, conectando na sua prática os valores da cooperação, da autogestão e da solidariedade.

A essa altura, também, muitos já devem ter se questionado se a economia solidária equivaleria ao socialismo. De fato, a economia solidária pode ser considerada uma forma de socialismo, o socialismo autogestionário (NASCIMENTO, 2003, p. 226-232). Para Paul Singer, por exemplo, a economia solidária é, na sua idealidade, o socialismo por excelência, considerando as demais tentativas de implantação do socialismo como experiências pseudo-socialistas, já que não passariam de economias centralmente planejadas (a exemplo da ex-URSS) ou de arremedos de autogestão numa economia de mercado (a exemplo da ex-Iugoslávia). Para os espíritas, vale considerar a idéia de um socialismo cristão[13], humanista e espiritualista, que não impõe, que não subvaloriza a criatividade e a vontade individual, mas que almeja a justiça, a solidariedade e o pleno desenvolvimento da humanidade. A este socialismo cristão consideramos equivalente ao que hoje se convencionou chamar de economia solidária[14].

Ação social espírita

Para finalizarmos este pequeno artigo, faremos uma breve reflexão sobre a ação social espírita e a transformação da sociedade. Sabemos da complexidade do assunto que traz à tona a discussão acerca do papel do Espiritismo no mundo. Não pretendemos fechar opinião ou apresentar qualquer síntese de pensamento. Nem nos sentimos capazes para tanto. Trata-se apenas de esboçar algumas questões e sugestões para encaminharmos a proposta de inclusão da economia solidária como pauta da ação social espírita.

Fundamentalmente, a ação social espírita se justifica a partir de um diagnóstico sobre as demandas por melhorias que a nossa sociedade apresenta. Intervir na sociedade para contribuir com o progresso[15], eis o objetivo mais geral da ação social espírita. Existem muitas formas legítimas de intervenção, já que as necessidades, as carências existentes no nosso planeta são múltiplas. Queremos, no entanto, enfatizar a necessidade de contribuirmos, enquanto espíritas, para uma mudança na organização da sociedade. Defendemos o princípio de que só podemos superar definitivamente os problemas existentes se atuarmos nas suas causas, não tratando meramente de minorá-los enquanto efeitos. O raciocínio é análogo ao que se pode aplicar às doenças: tratar das causas das doenças é o único modo de nos vermos livres delas, enquanto que o tratamento sobre os sintomas serve apenas para aliviarmo-nos temporariamente da dor.

A resposta à questão 930 d’O Livro dos Espíritos resume e exemplifica bem esta relação entre um problema e a sua causa estrutural: “Numa sociedade organizada segundo a lei do Cristo, ninguém deve morrer de fome” (grifo nosso). Está claro aí que o problema da fome só pode encontrar solução numa mudança organizacional da sociedade. E quando falamos de uma proposta de aderirmos à economia solidária, estamos falando justamente de uma mudança organizacional da sociedade.

Comumente, porém, pensa-se que o Espiritismo prescreve que a mudança da sociedade ocorre exclusivamente a partir da reforma ou transformação[16] dos indivíduos, numa relação causal linear e unidirecional. Todavia, diversas passagens d’O Livro dos Espíritos nos sugerem que a relação entre transformação individual e transformação social é bidirecional, uma influenciando a outra recíproca e incessantemente. No próprio comentário de Kardec à questão 930 acima citada esse raciocínio se evidencia:

Com uma organização social previdente e sábia o homem não pode sofrer necessidades, a não ser por sua culpa. Mas as próprias culpas do homem são freqüentemente o resultado do meio em que ele vive. Quando o homem praticar a lei de Deus disporá de uma ordem social fundada na justiça e na solidariedade e com isso ele mesmo será melhor.

Em reforço, podemos citar ainda uma passagem da resposta de Fénelon à questão 917, que faz referência às instituições sociais e à sua força influenciadora sobre a ação dos indivíduos:

(...) É o contato que o homem experimenta do egoísmo dos outros que o torna geralmente egoísta, porque sente a necessidade de se pôr na defensiva. Vendo que os outros pensam em si mesmos e não nele é levado a se ocupar de si mesmo mais que dos outros. Que o princípio da caridade e da fraternidade seja a base das instituições sociais, das relações de povo para povo e de homem para homem, e este pensará menos em si mesmo quando vir que os outros o fazem; sofrerá assim a influência moralizadora do exemplo e do contato.

Transformar as instituições é um modo eficaz de concorrer para a obra geral da criação – uma das finalidades da encarnação – e assim progredir (LE 132). Portanto, devemos nos dedicar a promoção do progresso geral para progredirmos individualmente. Precisamos “fazer o bem no limite das próprias forças, pois cada um responderá por todo o mal que tiver ocorrido por causa do bem que deixou de fazer” (LE 642). Neste particular, na questão 932 encontrarmos um alerta:

932. Por que, neste mundo, os maus exercem geralmente maior influência sobre os bons?

- Pela fraqueza dos bons. Os maus são intrigantes e audaciosos; os bons são tímidos. Estes, quando quiserem, assumirão a preponderância.

A educação aparece como a chave da transformação das instituições que sustentam e provocam os valores inferiores (LE 914). E, além disso, parece ser consenso que o Espiritismo encontra na educação o seu papel central de coadjuvante do progresso da humanidade, em consonância com o raciocínio exposto por Kardec n’A Gênese, cap. 18, itens 24 e 25.

Não obstante, educação não é somente escola, e evangelização não é apenas o ensino livresco de matéria cristã ou espírita. É neste sentido que queremos propor que as instituições espíritas assumam uma atividade educativa voltada para a autogestão e o cooperativismo. Diversas instituições espíritas já promovem em seus espaços ações educativas de cunho profissionalizante, visando à inclusão social para o mercado de trabalho. Por que não adotarmos então ações educativas que promovam a economia solidária, com o trabalho cooperativista e os valores da autogestão e da solidariedade? Esta prática seria ao mesmo tempo uma educação através do trabalho e uma educação do próprio trabalho, tornando-o solidário. Ao invés de inserir as pessoas num mercado de trabalho repleto de injustiças próprias ao capitalismo – solução apenas paliativa do problema da exclusão – poderíamos contribuir para a promoção de um novo tipo de trabalho, de num novo tipo de economia e de um novo tipo de sociedade, fundada nos valores da solidariedade, da autogestão e da cooperação, estreitamente relacionados ao ideal revolucionário francês (o qual Kardec referendou, como se pode verificar em Obras Póstumas) da tríade: liberdade, igualdade e fraternidade.

Para encerrarmos esse breve ensaio, uma última observação parece-nos crucial. Todos queremos a paz, o entendimento fraterno entre todas as pessoas. Porém, só atingiremos este ideal através da justiça:

812a. É possível que todos se entendam?

- Os homens se entenderão quando praticarem a lei da justiça.

Bibliografia

ARRUDA, Marcos. Socioeconomia solidária. In: CATTANI, Antonio David (org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003.

________. Humanizar o infra-humano: a formação do ser humano integral: homo evolutivo, práxis e economia solidária. Petrópolis: Vozes, 2003b.

KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Rio de Janeiro: FEB, 1995.

________. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 2002.

________. A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 1987.

________. Obras póstumas. Rio de Janeiro: FEB, 1973.

NASCIMENTO, Claudio. Socialismo autogestionário. In: CATTANI, Antonio David (org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003.

PAIVA, Aylton. O Espiritismo e a política para a nova sociedade: reflexão e ação para espiritualizar o social. Lins: Casa dos Espíritas Livraria Espírita Libertação, 1996.

SINGER, Paul. Aprender economia. São Paulo: Contexto, 2008.

WOOD, Ellen Meiksins. A origem do capitalismo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.



[1] Como podemos notar em alguns textos na Revue Spirite, Allan Kardec objetava que fossem discutidos assuntos como economia, política e religião nas sociedades espíritas, alegando que este tipo de assunto traria divisionismos que obstariam a unidade fraternal em torno dos princípios do Espiritismo. Assim, seria pertinente apenas a explanação genérica em torno de princípios morais amplos fundamentais à Doutrina Espírita. Entretanto, na prática Kardec imiscuiu-se nesses assuntos, opinando de acordo com o seu arcabouço cultural em temas como a desigualdade das riquezas (temática da economia), a igualdade de direitos e a liberdade de consciência (temas da política), e ainda diversos temas religiosos, como as doutrinas do céu e do inferno. De nossa parte, acreditamos que o Espiritismo, como corpo de conhecimento filosófico, toca em todos estes assuntos. O alcance e desenvolvimento das relações entre princípios morais gerais e suas conseqüências teóricas e práticas nos diversos campos do conhecimento e da ação humanos deve se efetivar através de um trabalho de reflexão e experimentação coletivos que parta de possíveis inferências de princípios básicos até a constituição de proposições mais complexas que permitam o teste na prática, tanto nas experiências individuais quanto coletivas. Sobre a relação entre política e Espiritismo, ver O Espiritismo e a política para a nova sociedade: reflexão e ação para espiritualizar o social, de Aylton Paiva (PAIVA, 1996).

[2] Sobre o pensamento social espírita, ver Anais do I Encontro nacional sobre a doutrina social espírita (1985) e Espiritismo e Sociedade, publicado em 1986 para o II Encontro nacional sobre o aspecto social da doutrina espírita (1987) em: http://viasantos.com/pense/livros.html.

[3] Esta definição etimológica de economia é usualmente utilizada por autores ligados ao movimento da economia solidária, que visam uma revisão crítica da própria ciência econômica de um modo geral.

[4] O bem exclusivamente para si, egoísta, em realidade não existe, não passa de uma ilusão. Os que pensam estar fazendo o bem para si, por exemplo, ao gastar grandes quantias de dinheiro para viver luxuosamente, na verdade estão fazendo o mal para si, por viciarem-se em prazeres egoístas que os afastam da relação amorosa com a humanidade.

[5] Entendo capitalismo como sendo, basicamente, um sistema sócio-econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção, encerrando uma contradição fundamental entre o caráter social da produção e o caráter privado da apropriação.

[6] Esta afirmação de Arruda é extremamente importante. A este respeito, o autor elabora engenhosamente uma reflexão filosófica utilizando-se de alguns dados científicos. Insiste, por exemplo, que o diferencial evolutivo do ser humano não é a agressividade nem a competitividade, mas sim a sociabilidade, a cooperação e a solidariedade. Para conhecer em detalhe estas proposições de Marcos Arruda ver Humanizar o infra-humano: a formação do ser humano integral: homo evolutivo, práxis e economia solidária (ARRUDA, 2003b).

[7] Capital, conforme Karl Marx, é uma relação social que, no capitalismo, assume o caráter de exploração do trabalho pelos capitalistas para a obtenção do lucro através da extração da mais-valia (o valor do trabalho não pago àquele que trabalha) da força de trabalho dos proletários (aqueles que não possuem os meios de produção). Com isso, além da produção de bens e serviços, obtêm-se o lucro e a manutenção do capital. O capital assume materialmente a forma de meio de produção.

[8] Meios de produção é tudo aquilo que serve à consecução da produção, incluindo terra, matéria-prima, instalações, ferramentas e mão-de-obra.

[9] É comum a muitos economistas alegar-se o fator “risco do negócio” como a contrapartida do empresário na relação capital-trabalho com o empregado. Entretanto, devemos indagar: risco equivale a trabalho? E ainda, o risco do investimento do capital em um dado negócio justifica moralmente o fato de o empregador ser mais bem remunerado que o empregado? Contudo, essa seria uma discussão válida, do ponto de vista prático e moral, somente se todos tivessem condições econômicas de optar por esse risco. Não obstante, mesmo no caso hipotético de uma igualdade econômica que desse a todos a condição de optar entre correr o risco do negócio ou trabalhar, ainda não percebo qualquer justificativa moral para dizermos que correr o risco do negócio é mais meritório do que trabalhar. Importa ainda a constatação de que, no mundo do trabalho, quem corre mais riscos em termos de sobrevivência ou de manutenção do atendimento a necessidades básicas para uma vida digna, é o operário e não o dono de empresa fartamente remunerado.

[10] Uma analogia talvez ajude a explicitar a injustiça. Imaginemos a seguinte situação: cinco colegas de faculdade fazem um trabalho em grupo, produzindo um texto para determinada disciplina. Todas se esforçaram, pesquisaram, escreveram; enfim, trabalharam coletivamente. O professor, considerando o texto impecável, dá uma nota ‘50’ para uma das colegas, enquanto as demais recebem zero. Justificativa para isso? Não, nenhuma. Aliás, a moça que recebeu a nota ‘50’ nem precisava ter feito nada para recebê-la. Ela simplesmente recebe 50, sem qualquer justificativa para isso. Esta moça, porém, tem a opção de distribuir a sua nota entre ela e suas colegas. Estas, por sua vez, reivindicam uma nota justa junto a ela. A moça então diz: “bom, uma nota justa seria aquela que lhes dessem condições para a aprovação na disciplina, então um ‘7’ para cada é justo”. Com isso, as demais quatro colegas do grupo recebem um ‘7’ cada, totalizando uma nota ‘28’. Resta ainda uma nota de ‘22’, que fica inteiramente com a moça que tinha inicialmente ‘50’. Ela com ‘22’, as demais com apenas ‘7’ cada. Injusto? Evidentemente que sim, pois a produção é coletiva e a apropriação é privada. Mas aí, virão “justificativas” para a situação... A moça do ‘50’ tinha o computador e os livros para a pesquisa, tudo absolutamente necessário para o trabalho, bem como as folhas e a impressora para a produção do texto impresso. Já as demais colegas não tinham nada disso, somente a sua força de trabalho para oferecer. Então, nada mais “justo” que a proprietária dos meios de produção receba a nota total pelo que foi produzido e a distribua “com justiça” entre suas colegas trabalhadoras. Ou então, quem achar que o problema moral aí existente é só pertinente aos indivíduos isoladamente, pode alegar que tudo se resolve se a dona da nota, a moça do ‘50’, evoluir moralmente, deixando de ser egoísta, passando a repartir “com justiça” a nota: assim, cada uma das cinco moças ficaria com um ‘10’. E ninguém precisa se preocupar em mudar o sistema...

[11] Veja-se, por exemplo, a prática dos cercamentos na Inglaterra dos séculos XVII e XVIII, com a expulsão em massa dos camponeses na demarcação da propriedade privada e exclusiva dos latifundiários que desejavam utilizá-la lucrativamente como pasto para a criação de suas ovelhas. Thomas More, o célebre autor de A Utopia, descreveu essa prática como “a devoração dos homens pelas ovelhas” (WOOD, 2001, p. 91-92).

[12] Veja-se a resposta à questão 922 d’O Livro dos Espíritos, acerca da existência de uma medida comum de felicidade para todos os homens: “– Para a vida material, a posse do necessário; para a vida moral a consciência pura e a fé no futuro” (LE 922, grifo nosso).

[13] Um socialismo de tipo “cristão”, a ser adotado pelos espíritas, só é pertinente se o cristianismo for entendido à luz do Espiritismo, isto é, em seu caráter universalista, preservando-lhe apenas o estritamente universal – que são os seus postulados morais fundamentais, resumidos na lei do amor (assim, o cristianismo pertencente à história e seus agentes humanos, naturalmente repleto de imperfeições, é descartado dessa adjetivação). Este socialismo cristão deve ser ao mesmo tempo humanista – por valorizar o desenvolvimento do ser humano com base nos seus direitos e deveres fundamentais, e nas suas potencialidades evolutivas. E ainda, certamente espiritualista, por assentar as bases da fraternidade, da igualdade e da liberdade na existência imortal do Espírito. Para os espíritas, parece válido assumi-lo simplesmente como “socialismo espírita”. Que estas distinções, não sirvam, contudo, para impedir os espíritas de aproximarem-se de outros segmentos da sociedade que porventura abracem a causa de um socialismo carregado de valores e princípios equivalentes ou similares àqueles mais fundamentais ao Espiritismo.

[14] Afirmar um socialismo cristão não significa a busca por um Estado teocrático. O Estado laico é uma conquista importante que permite, entre outras coisas, a liberdade religiosa. Sendo assim, o que queremos destacar aqui é que há uma convergência de princípios entre socialismo, cristianismo e economia solidária.

[15] Apesar da grande diversidade de acepção do termo ‘progresso’, para os espíritas ele prende-se ao conceito de evolução, caracterizando-se como uma trajetória que vai do imperfeito ao perfeito. Os parâmetros são intelectuais e morais. A finalidade é a felicidade.

[16] Os termos ‘reforma’ e ‘transformação’ parecem ser equivalentes para Kardec, por utilizá-los, ao menos aparentemente, de modo indistinto. Preferimos, todavia, o termo transformação ao termo reforma por indicar, numa acepção corrente, uma mudança mais ampla e profunda, tanto a nível individual quanto coletivo.